terça-feira, 29 de abril de 2008

Désengagement


Imagine uma situacão em que um homem e uma mulher se encontram em um trem. Em meio a cigarros, pequenas confições e a paisagem que passa, os dois vivem um entreato de paixão. Até agora, normal. Mas e se esse homem for judeu e essa mulher palestina?! Para o diretor Amos Gitai, nada muda. Muito pelo contrário. A situacão fica potencializada e o desejo jorra como um simples ato de possibilidade. "Désengagement", nova obra cinematográfica do artista israelense, não é um filme panfletário e nem dá respostas banais sobre um conflito ainda sem solução. O diretor e roteirista criou um história simples: uma francesa de origem judia (Juliette Binoche) deve ir ao encontro da filha que abandonou há anos em Israel e avisá-la da morte do avô. Com a ajuda do imão adotivo, encarnado pelo talentoso e belo Liron Levo, essa mulher cruza uma zona de conflito na Faixa de Gaza para encontrar a filha. O curioso é que o longa não é um super sucesso, nem algo fora do normal. É um filme simples, com planos imensos em que a ação se desenrola no tempo da emoção, não no tempo da edição. O que pega mesmo é como aquelas pessoas, o lugar onde elas estão, as questões de ordem duramente familiar e os conflitos são guiados pelo fundamentalismo seja do lado palestino ou israelense. Désengagement termina como começa, no ar, sem resposta pronta e sem solução. A violência, as fronteiras, os ideais ficam no reino das idéias, na imaginação de quem acaba de ver o filme.

quinta-feira, 24 de abril de 2008

UE - uma construção

Vir para a França é entrar no olho do furacão da União Européia. Por aqui, o Euro impera! É a moeda da vez para os investidores e o melhor "passaporte" para quem quer consumir o que quer que seja. Mas o mais curioso é a mudança de comportamento que uma moeda tão nova como o Euro implica na vida das pessoas. Mesmo que em supermercados e lojas na França ainda exista a conversão para o antigo Franco, os costumes e as relações entre os países europeus mudam a cada dia. Um exemplo simples dessa mudança é a circulação dos europeus no continente. Para aqueles que fazem parte da UE, basta apresentar a carteira de identidade. Passaporte só para estrangeiros e para os que ainda não integram o bloco. Ah... e este ano, a União Européia atinge o número de 27 países. Romênia e Bulgária entram para a comunidade e a mudança da moeda já começa a sacudir os ânimos das nações. O por quê? Muito simples! Na Romênia, o salário mínimo é algo em torno de 300 euros. Na UE, 1000 euros. Bom, para te situar melhor no tempo e no espaço, a idéia de uma Europa unida surgiu após a Segunda Grande Guerra, mais precisamente nos anos 50 com a atuação em conjunto de figuras como o general Charles de Gaulle, o empresário alemão Conrad Adenauer e do investidor francês Jean Monet. Já em 1957, foi criado o primeiro "Mercado Comum Europeu" com a assinatura do Tratado de Roma. 34 anos depois, em 1991, o Tratado de Maastrich institui a primeira zona de livre comércio européia, mas com a adesão de apenas 12 países. Em 1999, a União Européia ganha uma sede na cidade de Strasbourg. Agora, não só as relações econômicas tem peso. Uma corte de justiça européia, um fundo social e um Parlamento eleito por voto marcam uma mudança de mentalidade. Mas a grande virada mesmo foi no dia 1 de Janeiro de 2002 com a circulação do Euro. Em uma Europa cheia de estrangeiros e de pessoas vindas das antigas "colônias", uma moeda comum é a chave mestra. Afinal, quem possuir a senha entra na jogada e começa a lidar de igual para igual com aqueles que já fazem parte do jogo.

segunda-feira, 21 de abril de 2008

A cidade

Gertrude Stein define Paris como uma cidade "calma e excitante". Até agora, não encontrei outra definição tão precisa para Paris como essa. Durante o dia, a qualquer hora, em qualquer lugar, milhares de turistas se amontoam para comprar, ver, consumir tudo o que essa cidade tem para oferecer. Já nos parques, praças e bibliotecas, estudantes e afins disputam um banquinho ou uma cadeira para ler, ver, se entreter com algo. No metrô, pelo menos 3 pessoas por vagão com algum livro, revista ou jornal. Nas ruas, é difícil andar sem trombar com sacolas e embalagens. Seja de uma grande loja de departamentos, de um supermercado ou de uma loja de luxo, elas fazem parte da paisagem. Mas é durante a noite que todos os gatos ficam pardos e meio loucos! "A cidade não pára!" Gente subindo, gente descendo, gente rindo, bebendo, se divertindo, dançando, andando, fumando... ah... ufa! E olha que no fim de semana o metrô pára à 1h40. E isso é o de menos. Para você entender: 4 horas da manhã a rua lotada em locais como République, Belleville e Ménilmontant! Só fica em casa quem quer ou quem não está afim de deslocar, pois aqui a palavra de ordem é o deslocamento.

quarta-feira, 16 de abril de 2008

Seu pedido é uma ordem

Vista da Torre Eiffel da margem direita do Sena. Domingo, os carros são proibidos. A pista á para os "piétons".
Em Paris, são as férias escolares. As praças estão lotadas de crianças. Ah... esse é o Châtelet!
Elas, as crianças, brincam em volta dos monumentos, sobem em árvores e são as donas das praças e parques. Cuidado para não levar uma bolada!




Vista do alto da Torre Eiffel! Esse aí é o Campo de Marte.

segunda-feira, 14 de abril de 2008

"Palco, templo sagrado do ator..." A.A.




Uma das primeiras frases que ouvi sobre teatro foi: "...palco: templo sagrado do ator, ritual onde postulamos a nossa fé, é aqui o lugar onde os corpos se preparam para as batalhas". Quem escreveu isso foi Antonin Artaud. O mesmo autor que marcou como ferro em brasa a minha vida há 17 anos foi o impulso para que o diretor Peter Brook deixasse sua confortável carreira em Londres e partisse para uma aventura teatral na França. Estas fotos são do teatro Bouffes du Nord, local que Peter e sua trupe de atores multiculturais adotaram nos anos 60. Estamos em 2008, o teatro, hoje, é patrocinado pelo Governo francês. Peter Brook é um dos nomes mais reconhecidos das artes cênicas no mundo, mas ali, naquele espaço, naquele teatro, continua a existir algo de primitivo, uma fonte pura para quem dessa água deseja beber. Ir ao Bouffes du Nord é uma experiência sensorial. Atravessar o limiar daquela porta e entrar em um mundo dedicado ao sagrado e ao profano (que é o fazer teatral) foi emocionante. Vi a peça "Fragments". Peter Brook escolheu 5 cenas de 5 peças de Samuel Beckett e reuniu os fragmentos em uma peça teatral. Como o próprio Beckett escrevia em francês e inglês, e traduzia as próprias peças para ambos os idiomas, Brook fez uma doce brincadeira. Durante a semana, a peça é apresentada em inglês, mas com as legendas em hologramas nas paredes em francês. No fim de semana, o contrário. O resultado extraordinário é uma extensão desse espaço. Momento a ser guardado para a vida toda!

sábado, 12 de abril de 2008

Um ciclo de palestras com Edgar Morin


Pensamento descentralizado, humanidade, O Método e complexidade. Sexta e sábado, participei de um ciclo de palestras com o historiador, filósofo e antropólogo Edgar Morin. Organizado pela Mairie de Paris, o debate foi gratuito. Estudantes, professores, colegas da universidade, amigos, interessados, jornalistas... O Palais de Métallons ficou pequeno para tanta gente e idéias. Do alto dos 87 anos de idade, lá estava Edgar Morin. Sorridente e muito educado, ele discutiu sua obra com pesquisadores e com o público em 3 debates, na sexta-feira: Humanidade, Novas Mídias e Complexidade. No sábado, trechos do documentário sobre o pensador e as perguntas e homenagens do público deram o tom do encontro. Ainda sob o efeito das palavras de Morin, elocubro como um homem que cruzou o século XX e ainda atua no século XXI influencia tantas pessoas em continentes tão diversos. Dois professores, um do Congo e outro da África do Sul, foram até lá prestar homenagem a Morin. Bem humorado e levemente irônico, Edgar falou da obra que construiu com muito desapego. Segundo ele, nós, os leitores, somos os co-autores de qualquer obra literária, inclusive a dele. Sem nós, ele não teria feito nada. Do cinema a cultura de massas; das estrelas a questão dos judeus no mundo moderno; da literatura ao pensamento complexo, Morin é autor de um pensamento aberto e descentralizado. Voltado para a cultura, mas a partir do ponto de vista antropológico, Morin tem uma obra marcada por questões vigentes na contemporaneidade. Segundo uma aluna, ex-orientanda e colega de Sorbonne, Morin é um daqueles pesquisadores que não dá para etiquetar. Pensador voltado para a resistência, ele ainda volta os olhos para as minorias, para aqueles que estão à margem. Lugar, que segundo ele, sempre foi o seu.

segunda-feira, 7 de abril de 2008

sábado, 5 de abril de 2008

Funny Games U.S.

Vários diretores de diversas nacionalidades foram convidados para filmar em Hollywood. Muitos aceitaram e fizeram belos filmes (François Truffault, Fernando Meirelles, Alejandro Goanzáles-Inhãrritu, Milos Forman), outros não foram tão felizes (Alfonso Cuaron, Terry Gillian) e alguns, mais afortunados, simplesmente, viraram as costas e continuaram a fazer seus filmes sem cortes de estúdio, sem roteiros adaptados e sem a intervenção rigorosa dos empresários do cinema (Ingmar Bergman, Claude Chabrol, Fellini, Godard). Mas, em pleno século XXI, uma nova possibilidade chega a Hollywood. O diretor, roteirista e ator alemão Michael Haneke filmou no ano passado a versão americana do longa FUNNY GAMES. Mais conhecido pelos filmes A PROFESSORA DE PIANO e CACHÉ, Haneke fez uma obra prima sobre e a violência em 1997. Com uma força impressionante e um roteiro de tirar o fólego (e o chapéu), FUNNY GAMES foi classificado como horror, drama e thriller. O grande ator alemão Ulrich Muhe, falecido no ano passado e protagonista do belo A VIDA DOS OUTROS, fez parte da primeira versão. O detalhe importante dessa história toda é que Haneke não apenas refilmou o próprio longa. Ele manteve os mesmos planos, o cenário é idêntico, os cortes, o roteiro, a trilha, o figurino, enfim, só os atores mudaram. Fica muito claro que Haneke é um diretor, assim como Bergman, que fala sobre a geografia da alma, sobre espaços, arestas e buracos que são de todos nós. Não importa o país, o filme é o mesmo, pois a denúncia é a mesma. A versão norte-americana traz Naomie Watts e Tim Roth nos papéis que foram de Susanne Lothar e Ulrich Muhe. No Brasil, o primeiro FUNNY GAMES só circulou por festivais independentes e em locadoras bem especiais, mas com o título deplorável de VIOLÊNCIA GRATUITA. Já o novo FUNNY GAMES traz no nome as siglas U.S. Um cuidado de Haneke com a própria obra e uma subversão ao status da indústria norte-americana.

quarta-feira, 2 de abril de 2008

Ingrid, Tibet e boom!



Não é novidade para ninguém que a França tem um papel ativo em prol da democracia no mundo. Seja em causas humanitárias, sociais ou de estado, os franceses se aprumam quando o assunto é liberdade, igualdade e fraternidade (, mas que fique claro, tudo isso fora da França). Qual o motivo da minha colocação? Ontem, 1 de abril, o Presidente, Nicolas Sarkozy, fez uma declaração na TV em prol da libertação de Ingrid Betancourt pelas FARC, na Colombia. Ele inssistiu em enviar uma equipe meedica francesa para zelar pelo bem de Betancourt. Questionada sober a ajuda humanitária, a Cruz Vermelha declarou que o Presidente não os incluiu em nenhuma negociação com a guerrilha. Mas não é só isso! Por toda Paris, é possível ver declarações a favor da independência do Tibet. Seja uma bandeira ou apenas uma pixação, a postura dos franceses está lá, bem demarcada aos olhos do mundo. Mas curioso mesmo é descobrir que a segunda indústria que traz mais dinheiro para a França, após, é claro, o turismo, seja a tecnologia nuclear. A França importa pesquisadores e tecnologia para quase todos os países que se metem com a tal energia nuclear.

Soirée Slam - poesie vivante

Um encontro entre amigos, um encontro de poesia, um momento especial de troca pode ser chamado de soirée aqui na França. Segunda, dia 30/03, participei de uma Soirée Slam. Artistas, poetas e entusiastas das letras se encontram para declamar poemas, mas não com voz dura de "isto é um poema". Eles vivem a poesia como atores vivem a cena em um palco. Cada um a seu modo apresenta um texto ou de improviso ou escrito previamente. É quente, único e empolgante. Algo bem raro por aqui! O melhor é que o slam vem do gueto, da periferia. A voz de quem está à margem (literalmente) e se coloca de forma intensa e artística. Misto de hip-hop, rap, funk, reggae e Vivenciar uma Soirée Slam é uma das melhores coisas que fiz até agora na França. Delicado, arrojado, pouco pretencioso, mas muito autêntico, o slam não é algo tipo exportação. É resultado de um momento específico na história desse país e tem a força das asas de um borboleta. Para conhecer um pouco do Slam, que tem um brasileiro pulsante criando poesias e atraindo novos entusiastas, acesse o myspace do poeta Zefere ou conhece o belo trabalho de Souleymane Diamanka.