domingo, 18 de maio de 2008

Uma noite no museu


Pode até ser título de comédia americana, mas foi justamente isso que aconteceu! O Ministério da Cultura da França promove, de tempos em tempos, um evento delicioso, La Nuit des Musées. A partir das 18h até às 24h, alguns museus abrem as portas gratuitamente para o público. A dificuldade é escolher entre o Louvre, d'Orsay, Marmotain, entre outros. Eu fiquei com Versailles! A ida até o Château não leva mais do que 30 minutos, mas a visita se estende por 3, 4, 5 horas. De portas abertas, o palácio construído por Luís XIV em 1682 é um delírio concretizado. O luxo não cabe em palavras. A suntuosidade é tanta que pessoas boquiabertas e murmurinhos como ah, oh, uhn... são normais. Mas o diferencial da noite é que nas paredes, tetos, portas e em algumas janelas foram projetadas cenas de filmes feitos em Versailles. Para você entender melhor: quando entramos no castelo, nas escadarias que levam aos salões da corte, cenas do filme "La Revolution Française" de Robert Enrico foram projetadas no teto; ao passar pelo Salão de Marte imagens do filme "Le Roi Danse" de Gérard Corbiau; depois de cruzar a inexplicável Galeria dos Espelhos, cenas do longa "Marie-Antoinette" de Sofia Coppola e por aí vai. Parecia um sonho! Algo inefável. Com paredes cobertas de brocado, imensos lustres de cristal, pinturas e esculturas prestes a soltarem alguma confidência palaciana, Versailles tem ainda outro tesouro, os jardins. Obra da mais fina arquitetura e ousado paisagismo, os jardins foram projetados a partir das janelas, ou seja, criados para serem apreciados. Para cada ala, salão, galeria, uma paisagem diferente no exterior tão luxuosa quanto o interior do castelo. Sair de Versailles às 23h30 foi como participar de um baile de contos-de-fadas. Fica a certeza que, agora, vale uma visita durante o dia, mas guiada pela memória noturna das cenas, imagens e sombras do castelo.

sexta-feira, 16 de maio de 2008

Das coisas curiosas da vida



Na última quinta, estava eu em um bar aqui em Paris chamado "Favela Chic". Bom, quem já trabalhou em uma favela sabe que de chique uma favela não tem nada, mas o bar usa o "conceito" e blá blá blá, portanto, cabe, "entre aspas", o nome. Lá, fui ver um show de uma carioca, Tatiana Dauster, com 3 músicos: um percussionista cubano (Inor, que fez um xique-xique de tampinhas de garrafa); um flaustista francês (Bertrand, que já tocou no Farofa Carioca) e um guitarrista brasileiro (Jay, que de Minas conhece muito bem Corinto). O show foi muito legal, cheio de referências contemporâneas, mas sem perder o molejo do samba. O repertório dançante levantou as pessoas que foram jantar e lotou a pista de dança. Mas o que me deixou intrigada foi uma fala do percussionista. Em uma conversa sobre Cuba, Guantanamo, abertura, cinema e diversidade cultural, ele soltou uma frase que ficou retumbando em minha cabeça. "Cuba e o Brasil são muito parecidos. Da América Latina, acho que são os dois países mais parecidos". Olha, não passamos por uma ditadura de esquerda tão longa, mas por uma de direita que ainda reverbera em nossas vidas; a música é uma das referências culturais mais fortes que temos; a cultura africana é intrínseca em nossas raízes; a culinária tem como marca a diversidade; uma miséria avassaladora e uma riqueza vergonhoza compoem uma paisagem naturalmente privilegiada;  e por aí vai. Com dimensões que variam de ilha a continente, Cuba e Brasil são países latinos. Mercados potenciais e culturalmente borbulhantes, agora, os dois países soam, para mim, um pouco irmãos. Pode ser papo de quem "está" estrangeiro, mas foi uma comparação que eclodiu uma curiosidade sem precedentes em mim.

quarta-feira, 7 de maio de 2008

Portishead no Le Zénith

Em 1991, surgiu na cidade de Bristol, na Inglaterra, uma cena independente que, de certa forma, influenciou toda essa onda eletrônica que faz parte do rock nos dias atuais. Massive Attack, Tricky e Portishead encabeçaram essa mudança de comportamento e sonoridade. De todos, o Portishead foi e ainda é o mais célebre. Criado por Beth Gibbons, Geoff Barrow and Adrian Utley, o grupo do Reino Unido tem nas trilhas dos filmes de espionagem uma grande influência, daí a larga utilização das músicas deles no cinema. Beleza Roubada, O senhor da Guerra, Batman & Robin, Psicopata Americano, dentre outros longas trazem as canções do grupo inglês. E nos dias 5 e 6 de maio de 2008, aqui em Paris, o grupo subiu ao palco do Le Zénith para mostrar a última criação. O Portishead tem 3 discos de estúdio: Dummy de 1994; Portishead de 1997 e o récem lançado Third de 2008. O grupo ainda gravou um disco ao vivo acompanhado pela Filarmônica de Nova York, o álbum Roseland NYC Live de 1998. No entreato, cada um seguiu carreira solo. Gravaram outros discos, participaram de coletâneas, montaram gravadoras, mergulharam na música eletrônica e se encontraram em outubro de 2007 para criar o terceiro disco. O show no Le Zénith trouxe um trio para lá de turbinado. Os 3 integrantes da banda subiram ao palco acompanhados de 2 djs e um bateirista. A sonoridade foi impressionante! Assim que o show começou, um texto em português, mas português do Brasil, não de Portugal, introduziu a banda. Confortáveis, desencanados e nem um pouco apressados, o que causou um certo incômodo nos franceses, banda e músicos convidados fizeram um belo concerto. Copos d'água, cadeiras, sintetizadores e câmeras lado a lado com os artistas no palco. Sucessos, é lógico, fizeram parte da apresentação. Mas uma coisa muito interessante é a forma como eles utilizam as bases eletrônias. Eu tenho minhas restrições quanto a música só eletrônica. Parece que falta algo. Mas, ontem, no show, isso deu uma guinada. Vi e ouvi artistas criarem bases e momentos maravilhosos para a voz (no caso atormentada e belíssima de Beth Gibbons), para a guitarra, o baixo e o banjo. A música estava em primeiro plano, não um computador. Em tempo real, a performance no palco era editada e exibida em 3 telões que funcionavam como cenário e suporte de luz. Uma metalinguagem interessantíssima para um grupo que tem no cinema fonte de inspiração e diálogo. Tranquilos, eles voltaram para um bis, fizeram um show de 2 horas e ainda brindaram com garrafinhas de cerveja a apresentação.